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“A grama do vizinho é sempre mais verde.” - MICHEL DE MONTAIGNE |
Michel de Montaigne, já no século 16, observava isso nas pessoas, em seu comportamento, fatos sobre a autoestima, como as pessoas observavam a si mesmas.
Em seus estudos percebeu que a há muito tempo os
homens costumam, olhar por cima de seus muros, na direção
das terras de seus vizinhos, para admirar o que não tem e descontentar-se com
aquilo que possuem.
Longe de ser aplicado somente aos bens materiais
como pode parecer, mas em especial a insatisfação dos seres humanos se dá em
relação a si próprios, o que são, como pensam, a qualidade do que realizam,
como se percebem diante dos demais membros da comunidade em que vivem.
Michel de Montaigne, filósofo francês de origem
nobre, cuja obra mais celebrada tem como título "Ensaios", destaca a
necessidade do autoconhecimento e da valorização daquilo que somos, apesar dos
modelos e estereótipos sociais e culturais que nos são constantemente impostos.
"Este grande preceito é frequentemente citado em Platão: faz o teu feito e conhece-te a ti mesmo. Cada um desses dois membros engloba em geral todo o nosso dever, e igualmente engloba o seu companheiro. Quem tivesse de fazer o eu feito veria que a sua primeira lição é conhecer o que é e o que lhe é próprio. E quem se conhece já não toma como seu o feito alheio: ama-se e cultiva-se acima de qualquer outra coisa; rejeita as ocupações supérfluas e os pensamentos e projetos inúteis." Montaigne
Ele poderia se importar bem pouco com tal questão,
de família influente e muito rica, morava num imponente castelo, foi prefeito
da importante cidade francesa de Bordeaux por duas vezes. Com amigos influentes
incluindo o rei da França, culto e muito bem-sucedido, certamente percebia os
olhares invejosos dos demais durante sua vida e não daquelas pessoas que sobem
no muro e ficam a mirar as conquistas alheias sem se contentar com o que
conseguiram.
Aos 38 anos, Montaigne se retirou da vida pública e
resolveu se dedicar aos estudos, à filosofia, às letras, buscou então
inspiração e tema a respeito do qual pudesse falar com propriedade. Em sua
busca conclui que não dominava tão bem nenhum assunto quanto o conhecimento que
tinha sobre si próprio.
Em suas reflexões chega a conclusão que não estava
disposto a falar apenas de suas conquistas ou realizações, queria algo mais
profundo, verificar a alma humana, entender o ser humano e sua complexidade,
indo de alto a baixo, observando tanto aquilo que é corriqueiro, cotidiano e
enfadonho em nosso dia a dia quanto nossa relação com o corpo, as outras
pessoas, o trabalho, o pensar.
Em suas elaborações, procurou ser o mais conciso e honesto possível, então focou seu trabalho no conhecimento que cada ser humano
deve ter de si mesmo. A partir desse essencial saber, pensava Montaigne, o
homem poderia - e deveria - se aceitar melhor, aumentando sua autoestima,
evitando a tristeza que reside na eterna comparação com o outro, seu próximo, a
quem normalmente observa em seus triunfos, os quais pensa não ser capaz de
atingir, em muitos casos.
Montaigne averigou que os homens têm baixa
autoestima por conta de inadequações que neles mesmos percebem, que seriam de
caráter físico, intelectual e, ainda, aquelas causadas pelo julgamento alheio,
a opinião dos outros a seu respeito. Procuramos defeitos em nós mesmos, nos
achamos que somos altos demais ou baixos, obesos, magros em excesso, temos pés
chatos, orelhas de abano, usamos óculos, nossos cabelos são ralos ou escassos,
longos ou escuros etc.
Sobre o aspecto físico o filosofo tem razão desde
sua época até a atualidade, para se ter ideia o Brasil é o segundo no ranking
em cirurgias plásticas meramente para fins estéticos, ou seja, por insatisfação
da aparência física. E cresce muito a intervenção cirúrgica estética em jovens
de 15 a 18 anos que são plenamente influenciadas pela mídia.
“Haja insatisfação e descontentamento. A autoestima
das pessoas precisa ser melhorada” dizia Montaigne desde sua época.
Se com nossos corpos é tão evidente esse
descontentamento, o que dizer então se olhamos para os lados e observamos os
modelos sociais de beleza, inteligência, sucesso? E se os comentários e
observações feitas por outras pessoas demonstram que estamos a léguas de
distância de tais padrões? A situação piora muito, não é mesmo?
A sociedade de hoje, diferentemente da França do
Século 16, é marcada pelos dados comparativos, usados em larga escala em
praticamente todos os momentos de nossas vidas. Somos equiparados aos demais
seres humanos em nossos trabalhos, na escola, na vida social, quanto aos nossos
rendimentos, bens e variados símbolos de prosperidade. O ranking tornou-se mais
que uma moda passageira, veio para ficar, e estipula que se não estivermos no
topo, estamos mal, muito mal mesmo.
Ao fazer isso, por exemplo, dentro de empresas, se
define quem irá ter as melhores posições hierárquicas, maiores salários,
propostas mais atraentes e, certamente, como resultado, qualidade de vida
destacada. Com isso, passamos a nos odiar se não estamos entre os primeiros
nessas avaliações e começamos a almejar ser como os vencedores.
O que isso provoca para nossa autoestima? É
devastador. As pessoas se sentem não apenas incomodadas, mas verdadeiramente
fracassadas e arruinadas em muitos casos.
Montaigne propõe que pelo autoconhecimento sejamos
capazes de nos conhecer melhor, tanto no que se refere a nossas imperfeições
quanto as qualidades que possuímos. Ao fazê-lo, quer que entendamos melhor quem
somos e nos aceitemos como somos. Valorizar-se é a palavra de ordem.
"Reis e rainhas também defecam", diz o
sábio francês, com o intuito de dizer que no final das contas, ricos e famosos
também são seres humanos, como nós, com defeitos e virtudes. Ele não rejeita ou
refuta a comparação como indicativo de caminhos para o ser humano, o que seria
impossível deixar de fazer, mas sugere que aprendamos com os outros sem que,
para isso, nos coloquemos no limbo da história, desprezando nossas
possibilidades e diminuindo nossas chances reais de triunfarmos a partir
daquilo que é nossa maior qualidade, a originalidade.
Quando copiamos os outros cometemos o que Montaigne
considera o pior de todos os pecados, o mais mortal de todos, abdicamos de nós
mesmos em favor de modelos pré-estabelecidos, abrimos mão de mostrar ao mundo a
nossa real identidade. Seja você! Valorize-se! Entenda-se! Triunfe por sua
originalidade! Você é único!
Montaigne nos ainda nos ensina que, para melhor
compreender a si mesmo, temos que conhecer melhor os outros, entrar em contato
com outras culturas, respeitar a diversidade que existe no mundo (certamente
uma de nossas maiores riquezas).
Como fazer isso? Viajando tanto física quanto
mentalmente, ou seja, colocando a mochila nas costas e partindo para
experiências aonde for possível chegar e, ao mesmo tempo, lendo e estudando!